VAI BRASIL!!!
- Mas eu sou portuguesa!
- E brasileira também.
- Não sou nada!
- É sim!
Lembro-me destas desafiantes discussões com o meu pai. A
minha conceção do mundo estava numa idade desafiante e não aceitava que eu
pudesse ser de outro país que não o que me viu nascer e o único onde tinha
vivido até então. Lia a banda desenhada da Turma da Mónica, papava todas
telenovelas e séries da Globo, tinha cds
do Netinho e da Daniela Mercury, comia mangas, papaias e camarão com catupiry,
ouvia o meu pai falar com aquele sotaque cantado e aquelas palavras que depois
eu repetia na escola e ninguém percebia, mas era 100% tuga. E não havia maneira
de que mudasse de ideia, eu, que com uma década e troca o passo de idade já
tinha o mundo todo descascado na palma da mão. A adolescência é mesmo estúpida
e não vai mudar nunca. Mas o meu pai, um pouco como todos os pais, nunca se
cansou.
Por sorte, a minha conceção do mundo expandiu-se para lá da
idade do armário, ganhou formas com ângulos mais defensáveis, construiu conceitos verosímeis e
assimilou a possibilidade de alguém não ser só de onde nasceu. Hoje, a minha conceção
do mundo acha que uma pessoa é de onde se sente. Que a nacionalidade é mais
carimbada pela vida que pelo passaporte.
Hoje, quando me perguntam de onde sou, invariavelmente
respondo: metade portuguesa, metade brasileira. E a reação sempre é de
surpresa. Não só é uma resposta politicamente correta mas também coerente com o
que eu sinto. Além disso, ser brasileira tem uma ótima cotação. Na verdade,
quando só digo que sou portuguesa é porque não desejo muito mais conversa com o
meu interlocutor. Sem querer ofender a pátria mãe, a imagem de Portugal no
mundo não é propriamente sedutora. Dizer sou portuguesa desperta um tímido “ah”,
ou um olhar comprometedor de “onde couves é que isso fica?”, enquanto que o sou
brasileira recebe um “aaaaaaahhhh!” cheio de sambas.
E eu sou brasileira. Sou mesmo. Tenho o passaporte, tenho o
direito a votar, tenho pai brasileiro, tenho
lá metade da família, tenho amigos brasileiros espalhados pelo mundo. Vivi no
Brasil, trabalhei no Brasil e estive de férias no Brasil mais vezes que no
Algarve. A Tropa de Elite é um dos meus
filmes preferidos. Tenho, desde pequena, uma camiseta do Corinthians! Mas,
principalmente, sei que sou brasileira porque se me põe a pele de galinha com
as multidões que invadiram a Paulista e tantas outras avenidas do Gigante por
natureza.
Porque não descansei até ter lido todas as notícias da Folha de São Paulo
e ter perguntado à minha prima como tinha sido, como tinha acontecido. Porque
tenho uma vontade ardente de estar ali com eles e gritar em uníssono. Porque
sei a razão que o povo tem e enche-me de alegria que eles também saibam e que uma
nação tão grande e imensa se una em prol dos seus direitos. Porque sofro quando
vejo como vivem as pessoas e como o poder as usurpa de forma corrupta. Se há país que tem tudo para que à sua gente não
falte de nada, esse país é o Brasil. E é preciso mudar até que seja assim. Não
é preciso deixar de jogar futebol. Só é preciso estabelecer prioridades. E a
primeira tem de ser o bem-estar geral.
Por isso eu sou Brasil. Sou Brasil hoje, contra a Espanha, e
sempre. Contra tudo e todos que não sejam pelo melhor do Brasil.
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