Mataram o i
Hoje descobri que fecharam o jornal i, onde trabalhava,
trabalha ainda sem saber bem onde, um ex colega e amigo meu da universidade.
Havia ali muita gente da minha universidade, essa dos “80 melhores alunos do
país”, que é o que nos dizem no primeiro dia de aulas. Havia ali muita gente
boa, gente que escreve mesmo bem que eu sei, e que conseguiu construir um
jornal vencedor. Gente que deu um look diferente às notícias, espaço de antena
aos desportos “plebeus” e uma maneira inovadora de contar a realidade sem
perder o rigor informativo. Os prémios que o i ganhou falam por si.
Não sei os detalhes da decisão de matar o i. Mas sei que um
jornal é uma empresa, um negócio puro e duro. Por isso, como todas as empresas,
os jornais também procuram mão de obra barata e estagiários infinitos. Os
jornais também se vendem à publicidade, aos interesses políticos e aos
financiadores. Os jornais também mudam de
marca e de conceito, e metem cunhas e fazem despedimentos improcedentes.
É engraçado que, justamente hoje, recebi uma oferta de
trabalho de uma empresa que está à procura de um diretor de comunicação corporativa
para todo o grupo (têm 6 marcas diferentes), com 5 anos de experiência,
titulação académica e inglês perfeito. Oferecem um salário inferior ao de um
empregado de mesa num restaurante aqui da Rambla. Espelha bem a atual mentalidade
empresarial: contratar profissionais com formação e experiência a
preço de estagiário ou, se possível, grátis.
Assim, é difícil acalentar a ilusão no trabalho que se faz,
acreditar que a empresa é uma segunda casa, acarinhar os projetos como se
fossem nossos e dar tudo por eles. Sacrificar horas e engolir sapos. Que sabem
sempre tão mal!
Ficar à volta nas camas a pensar em ideias, estratégias,
soluções!
É difícil porque depois acontecem estas coisas, mandam as
pessoas embora como se não estivessem ali há anos, fecham e mudam de nome,
partem o projeto em mil estilhaços e não importa nada do que fizemos, do que
dissemos, do que sacrificámos. Só somos parte da empresa quando lhes interessa.
Quando é para fazer horas extras e trabalhar por 3 e cobrar o mínimo por mês.
Depois somos descartáveis, como talheres de plástico. O problema é que ao
contrário dos talheres de plástico, nós temos um coração e uma frustração avassaladora
quando vemos que fizemos todo aquele esforço em vão. Que acreditámos tanto numa
coisa que, de repente, deixou de existir sem que o pudéssemos impedir.
As pessoas, os ideias, a filosofia e a ética não fazem parte
dos negócios.
Os negócios são números. E a malta de letras está bem lixada.
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