A sentencia das estrelas
Ontem fui a
um jantar peculiar.
Tinham-me
pedido de antemão que enviasse a minha data de nascimento, local e hora exata.
O anfitrião
do jantar trouxe-nos um astrólogo que fez o mapa astral de cada um dos
convidados. No princípio achei muito giro, até porque quando nasci também fizeram
o meu mapa astral e nunca me explicaram com clareza o que é que dizia. O único
feedback que recebi foi: não te preocupes, disseram-nos que ias ser muito feliz
e que havia coisas muito boas na tua vida. E isto foi exatamente a mesma coisa
que o meu pai disse à minha irmã. Só que ela nasceu 3 anos depois de mim e 4
meses antes do meu aniversário.
Desde então,
pergunto-me se terão visto nos meus astros algum buraco negro e não me quiseram
contar.
Ontem era o
dia de dissipar todas as dúvidas. O astrólogo propunha-se a fazer uma interpretação
da nossa pessoa de acordo com os elementos que nos influenciam, indicando-nos
os nossos pontos fortes e as nossas debilidades, para podermos alcançar
melhores resultados nas nossas vidas. E depois disso aceitava perguntas – este
seria o meu momento!
Começou
tudo muito bem, a explicação sobre a astrologia, a definição dos meus traços pessoais
e a exaltação do meu grande potencial, sim ele disse isso, para triunfar na
vida, especificamente no âmbito literário! Ena pá, e será que ainda demora
muito? Porque já passaram 20 anos desde que a minha professora de português disse
a mesma cosia e cá continuamos na cepa torta, sem ponto parágrafo.
Tenho
alguns defeitos acentuados, como a impaciência e o orgulho, mas supero-os com
qualidades como a bondade, a generosidade e a responsabilidade. Diz o senhor
astrólogo que eu ilumino qualquer sala onde entro, que tenho fogo, que
transmito entusiasmo e que as pessoas gostam de estar à minha volta.
Até aqui
tudo fantástico, tudo muito Disney, viva a astrologia ole, ole! O problema foi
que, de repente, o astrólogo interrompeu o seu rol de elogios sobre a minha
pessoa e ficou a olhar, muito sério, para o meu mapa.
O tom da
sua voz mudou quando disse que Saturno estava a exercer uma influência maléfica
no meu caminho, principalmente no campo laboral. Raios partam com Saturno, que
mal fiz eu a Saturno? Não podia ser Júpiter, que é mais fofinho?
Não
satisfeito em dar-me só essa má notícia, salientou também que a lua estava numa
posição que impedia a minha progressão. E pronto, isto mais ou menos responde à
pergunta anterior, sobre quando chegará o meu sucesso literário. Para este ano
com certeza que não está escrito nas estrelas, porque Saturno e a lua vão
entorpecer o meu céu o ano todo, sendo março o pior mês, mas depois não é que o
panorama melhore, fica apenas menos mau.
Só faltou mesmo
dizer-me que ia ficar sem trabalho e ia mendigar para a Plaza Catalunya.
Que boas
notícias, deixam logo uma pessoa de bom humor e cheia de esperanças, não é
verdade?
Sentiu-se na
sala uma tensão de faca de cortar o pão misturada com um pouco de pena alheia.
Para desanuviar, decidiu-se mudar de campo e falar de amor. Péssima ideia. Mais
uma vez, o astrólogo ficou em silêncio, o que agora já sabemos, é mau sinal. A
coisa mais esperançosa que ele me disse, não tanto por emanar esperança, mas
porque foi mesmo a única coisa que ele disse, foi “ainda não encontraste a
pessoa certa”. Toda uma revelação...
O nosso
host, notavelmente comovido por toda a desgraça que se me avizinha, pediu-lhe
que me dissesse mais qualquer coisa, ao que o astrólogo respondeu, “É melhor não,
porque se não vai ficar deprimida.”
(Mais
ainda??? Porque até agora foi o quê, uma sessão de meditação e relaxamento?)
A esta
altura do campeonato, já só restava uma pergunta:
“Vou morrer
este ano?”
Diz que não!
Pelo menos isso foi positivo. Parece que cou continuar a viver para poder sofrer
todas as desgraças laborais e amorosas que Saturno e a lua estão a planear para
o meu ano, com todo o carinho do universo.
Em conclusão:
sou uma pessoa espetacular e com um potencial incrível, mas a minha vida é um
cocó de pombo.
Nunca mais
vou olhar para o céu da mesma maneira.
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